A Fórmula 1 consegue sobreviver a um colapso financeiro em 2020 ?

ANÁLISE: A Fórmula 1 consegue sobreviver a um colapso financeiro em 2020?

No momento, esta é apenas uma questão teórica, já que oficialmente ainda há 14 etapas marcadas no calendário da Fórmula 1. Seis outras, com a exceção de Mônaco e Austrália entre as oito afetadas, estão esperando novas datas.

Em seu comunicado mais recente, o CEO da F1, Chase Carey, sugeriu que ainda pode ser realizada uma temporada com 15 a 18 provas, apesar de que, com o passar do tempo, isso parece ser cada vez menos realista, já que o início em potencial parece ficar mais tarde no ano.

Não precisa ser um analisa da Wall Street para entender a situação complicada que a F1 se encaminha. Praticamente toda a sua renda esperada depende de um fator óbvio: as corridas acontecerem.

Essa renda foi de mais de 2 bilhões de dólares em 2019. A maior porção vem de três fontes primárias, sendo elas as taxas de realização das provas (30% da renda do ano passado), taxas de transmissão (38%) e patrocínios (15%). Outras fontes incluem as áreas do Paddock Club e negócios vindos da F2 e da F3.

Em 2020, a F1 esperava gerar uma renda maior, graças à adição da 22ª corrida. Agora, se encontra em uma situação onde cada GP que não é realizado representa uma perda de renda que varia de 30 a 50 milhões de dólares pela taxa de realização (com a exceção de Mônaco, que não paga).

Essas taxas de realização das provas foram pagas adiantadas, então há também a dúvida sobre o destino desse dinheiro, se será reembolsado, ou se a F1 segurará como “depósito” para o GP de 2021.

Perder as taxas de realização são o resultado direto de cancelamentos das provas – mas com o empilhamento de GPs cancelados, outras fontes também serão atingidas. As emissoras que transmitem o campeonato pagaram por uma temporada completa, e, caso o número de corridas caia, eles também estarão em uma situação complicada com seus próprios patrocinadores e assinantes.

Foi apurado que, caso o número de corridas realizadas seja menor que 15, coincidentemente ou não o número mínimo que Carey pretende fazer – as emissoras terão um reembolso parcial e progressivo. Se a temporada completa for cancelada, não se pode esperar que eles paguem quando não tiveram nada para mostrar.

Renault packing crates in the paddock

Renault packing crates in the paddock Photo by: Sam Bloxham / Motorsport Images

Não se sabe quais tipos de disposições de cancelamento existem nos principais acordos de patrocínio da F1 com empresas como Heineken, DHL e Emirates. Afinal, quem poderia prever que uma temporada poderia ser totalmente aniquilada?

Porém, com as emissoras, não se pode esperar que eles paguem o preço total se elas não puderem promover suas marcas através de um cronograma de corrida completo.

Então, quais são as perspectivas comerciais para a F1 com o encolhimento gradual de seu calendário de 2020 – e o que o mundo financeiro pensa sobre isso?

A Moody’s Investors Service, uma das agências de classificação de risco de crédito do mundo e provedora de informação financeira, divulgou um guia intrigante. Apesar das difíceis circunstâncias, e com algumas ressalvas, ela acredita que a F1 tem a habilidade para navegar nesse mar desconhecido.

Quando os analistas da Moody’s analisam a performance de uma empresa, eles pesam os positivos e negativos, ou, essencialmente, os riscos, e criam uma avaliação da direção em que a performance financeira se encaminha.

Em um relatório divulgado na quinta, a Moody’s deu à F1 – ou oficialmente à holding “Alpha Topco Ltd” – uma classificação de dívida “B2”, ou seja, que envolve algum risco. Ele acrescenta que “as perspectivas foram alteradas de negativa para positiva”.

Em uma primeira análise, isso não parece muito promissor.

De fato, a Moody’s diz o seguinte sobre o futuro imediato da F1: “A disseminação rápida e ampla da pandemia do coronavírus, que deteriora a economia global, derrubando os preços do petróleo e a queda de preço dos ativos, estão criando um grave e extenso choque de crédito em muitos setores, regiões e mercados”.

“Os efeitos de crédito combinados desses desenvolvimentos são inéditos e afetaram adversamente a F1 devido à interrupções em seu calendário”.

A Moody’s também deixou claro que a imagem real depende do número de corridas que poderá eventualmente realizar.

“Não é possível prever o destino da temporada 2020 neste estágio, com várias opções possíveis, que vão desde uma diminuição modesta para 15 a 18 corridas, até o cancelamento da temporada inteira”.

Resumindo o impacto, a Moody’s tinha “expectativas de geração de lucro e fluxo de caixa mais fracos, mais alavancagem e erosão da liquidez em 2020 como resultado dessa interrupção no calendário”.

Chase Carey, Chairman, Formula 1

Chase Carey, Chairman, Formula 1 Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

Em termos leigos, a F1 deve ir fundo em suas reservas e emprestar mais dinheiro para dar conta de atravessar 2020.

A Moody’s também lembra que, mesmo sem o Covid-19, a F1 já tinha vários desafios para superar em 2020, como a assinatura do novo Pacto de Concórdia, que valeria a partir de 2021, e o fato de que um grande número de acordos de transmissão chegam ao fim este ano.

“A Moody’s também não espera um novo Pacto de Concórdia resulte em um resultado econômico menos favorável para a empresa. No entanto, permanece um certo risco de execução até que ele seja assinado”.

O relatório ainda adverte que “um rebaixamento pode ocorrer se um Pacto de Concórdia for negociado com termos materialmente adversos para a empresa, como um fundo de prêmios mais alto para as equipes (quando medido como uma porcentagem dos ganhos antes dos pagamentos das equipes)”.

Tudo parece um pouco perigoso, mas as empresas ao redor do mundo, em todas as áreas, estão em posições igualmente desafiadoras.

Crucialmente, a Moody’s vê a luz no fim do túnel para a F1. Mesmo se a temporada de 2020 não for realizada e, assim, a entrada de renda desaparecer, os analistas acreditam que a empresa terá a capacidade de se recuperar em 2021 e além – tudo isso, claro, se o calendário voltar ao normal e o Pacto for assinado.

A Moody’s resume os pontos fortes inerentes da F1 como “a flexibilidade de custos da empresa, baixos gastos de capital e a forte margem de liquidez para gerenciar cenários severos de queda, incluindo o cancelamento total da temporada 2020”, juntamente com “a natureza resiliente dos fluxos de caixa da empresa, impulsionada por contratos com duração de vários anos e a força da franquia da F1 apoiando a recuperação do desempenho comercial e financeiro após a crise do coronavírus”.

Essencialmente, a Moody’s acredita que a marca da F1 é grande o suficiente e tem acesso a dinheiro suficiente para navegar pela tempestade de 2020, mesmo se a temporada for perdida.

“A F1 tem uma liquidez forte e uma base de custos suficientemente flexível para lidar com uma temporada de 2020 severamente reduzida, o que a Moody’s considera que provavelmente seria capaz de suportar um cancelamento total”.

“Em 31 de dezembro de 2019, a F1 possuía uma margem de liquidez de cerca de 900 milhões de dólares, incluindo um saldo de caixa de 400 milhões e facilidade de crédito rotativo não utilizado de 500 milhões”.

“A Moody’s acredita que isso seja suficiente para absorver saídas de caixa de possíveis reembolsos dos pagamentos adiantados de promotores, patrocinadores e emissoras, pagamentos de equipes, outras despesas gerais e custos com juros no caso de cancelamento da temporada 2020”.

A empresa qualifica seu julgamento com base na disponibilidade de financiamento da seguinte forma: “A avaliação da margem de liquidez em um cenário de cancelamento completo é complexa e ainda existe um risco de que a liquidez não seja suficiente, embora a Moody’s considere esse risco baixo”.

Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 W10, leads Max Verstappen, Red Bull Racing RB15, Charles Leclerc, Ferrari SF90, Sebastian Vettel, Ferrari SF90, Alexander Albon, Red Bull RB15, Lando Norris, McLaren MCL34 and the rest of the pack at the start

Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 W10, leads Max Verstappen, Red Bull Racing RB15, Charles Leclerc, Ferrari SF90, Sebastian Vettel, Ferrari SF90, Alexander Albon, Red Bull RB15, Lando Norris, McLaren MCL34 and the rest of the pack at the start Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

“A companhia também pode conseguir apoio de sua dona, a Liberty Media Corporation, que atualmente tem recursos substanciais disponíveis”.

Ela alerta que pode ter um problema de alavancagem – essencialmente a relação dívida / lucro que a F1 está autorizada a operar – mas considera que o problema poderá ser superado se os credores envolvido concordarem.

“Há uma probabilidade relativamente alta de que a empresa irá violar sua obrigação de alavancagem em 2020, que se aplica quando a linha de crédito rotativo for sacada ou se tornar disponível”.

“Os termos das instalações com garantia sênior permitem que o acordo de alavancagem seja alterado ou dispensado pela proporção necessária dos credores da linha de crédito rotativo”.

Falando mais sobre isso, diz: “Esta é uma consideração secundária por trás do gerenciamento da interrupção causada pelo coronavírus em 2020 e as futuras metas podem ser alteradas”.

“No entanto, a empresa permanece bem posicionada para recuperar as métricas do balanço quando as atividades normais forem retomadas”.

Isso parece positivo, embora a Moody’s enfatize que sua avaliação pode ser rebaixada se a F1 não manter esse número crucial de alavancagem sob controle após o fim da crise, e ressalta que “ainda existem desafios para melhorar o balanço da empresa após 2020 no contexto de um ambiente econômico potencialmente mais fraco”.

No entanto, a conclusão geral é que a F1 pode atravessar 2020 e chegar ao final inteira. Afinal, é um negócio único, com uma história de sucesso e uma estrutura incomum.

Seus maiores custos anuais são os pagamentos às equipes e, à medida que a receita cai para zero, o total do pagamento diminui. E, embora tenha hoje uma conta salarial muito maior que nos dias de Bernie Ecclestone, os custos relacionados às corridas – como transporte e viagens – também serão significativamente reduzidos.

Em adição, a maioria das corridas e acordos de TV e patrocínio estão determinados para 2021, então, em teoria, a entrada de renda a longo prazo está garantida.

A Moody’s concluiu que “a F1 está relativamente bem posicionada para se recuperar após a crise do coronavírus, sustentada por sua natureza de receita contratada, franquia forte, grande base de fãs e alta conversão de caixa”.

“A empresa pode enfrentar algum desafio de receita em 2021, devido ao momento das renovações dos contratos de TV, bem como um cenário macroeconômico fraco”.

“No entanto, a força e atratividade da franquia da F1 oferecem alguma proteção no contexto de desafios mais amplos do mercado de transmissão”.

O outro lado da história envolve as equipes: todas as dez equipes conseguirão sobreviver ao rigoroso 2020 e estar em posição para assinar o novo Pacto de Concórdia? Caso contrário, a mão da F1 será substancialmente enfraquecida.

The sun rises over the paddock.

The sun rises over the paddock. Photo by: Sam Bloxham / Motorsport Images

Fonte Motorsport

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